Muito se tem discutido sobre a emissão da Nota Fiscal de Serviço Eletrônica (NFS-e), especialmente diante da obrigatoriedade de adequação ao padrão nacional a partir de janeiro de 2026.
Atualmente, a NFS-e representa um dos maiores desafios para empresas prestadoras de serviço, em razão da ausência de padronização: cada município possui seu próprio layout, o que dificulta o desenvolvimento de soluções unificadas e eleva os custos operacionais.
Com a reforma tributária, espera-se a unificação dos documentos fiscais. No entanto, esse processo será gradual, e a NFS-e não será padronizada de forma imediata em todos os entes federativos.
A Lei Complementar nº 214/2025, no seu art. 62, estabelece que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão:
- Adaptar os sistemas autorizadores e emissores à estrutura padronizada da NFS-e, de forma a permitir a declaração dos dados necessários à apuração do IBS e da CBS;
- Compartilhar os documentos fiscais eletrônicos com o ambiente nacional de uso comum, administrado pelo Comitê Gestor do IBS e pelas administrações tributárias dos entes federativos.
A partir de 1º de janeiro de 2026, os Municípios e o Distrito Federal deverão:
- Autorizar a emissão da NFS-e no padrão nacional, diretamente no ambiente nacional, ou utilizar sistema próprio, desde que compatível e compartilhado com a plataforma nacional;
- Compartilhar o conteúdo de outras declarações eletrônicas com o ambiente nacional.
O não cumprimento dessa obrigação resultará em sanções severas, incluindo a suspensão das transferências voluntárias da União.
Consequências do descumprimento
O não atendimento às exigências implicará, entre outras medidas, a suspensão das transferências voluntárias da União aos entes federativos inadimplentes, conforme previsto no caput do art. 62. Na prática, isso poderá comprometer a arrecadação de municípios que não conseguirem realizar os ajustes técnicos necessários até o início da obrigatoriedade – 01/01/2026.
Impactos operacionais e fiscais
Embora o objetivo da padronização seja legítimo e positivo do ponto de vista da racionalização fiscal, a sua implementação trará custos operacionais relevantes para os municípios e para os contribuintes.
Diversos entes, especialmente os de menor porte, enfrentam limitações orçamentárias e tecnológicas que podem dificultar a adaptação aos novos padrões exigidos. A adequação demandará investimentos em infraestrutura, atualização de sistemas e capacitação técnica. Muitos municípios, por questões práticas, poderão ser levados a abandonar seus sistemas locais e migrar para o emissor nacional gratuito, o que, embora previsto, pode representar uma centralização operacional indireta.
Para os contribuintes, o processo de padronização da NFS-e representa um avanço importante, com potencial para simplificar obrigações acessórias e reduzir a complexidade operacional. No entanto, o que se observa na prática é que muitos prestadores de serviços e fornecedores ainda não estão preparados para se adequar às novas exigências, muitas vezes por desconhecimento técnico ou ausência de orientação adequada.
Nesse contexto, o papel dos tomadores de serviços de maior porte será fundamental. Não se trata apenas de exigir a conformidade ao novo padrão, mas de promover uma atuação proativa de conscientização junto à cadeia de prestadores, evitando falhas que possam comprometer a continuidade das operações e o cumprimento das obrigações fiscais.
Acompanhamento e próximos passos
A Receita Federal tem recomendado que os municípios iniciem a transição ainda em 2025, de forma a permitir uma fase de testes e ajustes técnicos. Para o setor privado, será fundamental acompanhar a evolução das normas e das notas técnicas publicadas pelo Comitê Gestor da NFS-e, adaptando sistemas e processos internos ao novo modelo de emissão e apuração fiscal.
A NFS-e padronizada será um dos primeiros instrumentos efetivos da nova realidade tributária. O sucesso na sua implementação será essencial para garantir a operacionalização do IBS e da CBS, e para consolidar a reforma como um mecanismo eficiente de arrecadação no novo modelo de tributação do consumo.
Atualizações do leiaute da NFS-e – Nota Técnica nº 003/2025
Objetivo da nota técnica
A Nota Técnica nº 003/2025 atualiza e consolida a terceira versão dos agrupamentos e campos opcionais do leiaute da NFS-e padrão nacional. A finalidade é adequar o documento fiscal às exigências técnicas e normativas associadas à apuração do IBS e da CBS, cuja obrigatoriedade inicia-se em janeiro de 2026.
Nova modelagem do processo de emissão
A emissão da NFS-e passa a envolver três etapas principais:
- Declaração de Prestação de Serviço (DPS) preenchida pelo prestador.
- Validação e cálculo do IBS e da CBS pela Sefin Nacional.
- Emissão da NFS-e contendo a DPS encapsulada e os campos específicos da apuração dos tributos.
Inclusão do grupo IBSCBS na DPS
A principal novidade no layout da DPS é a inclusão do grupo IBSCBS, que comporta campos para:
- Finalidade da NFS-e (regular, crédito, débito, entre outros).
- Indicador de uso pessoal do tomador.
- Código da operação (cIndOp), com base nas hipóteses previstas no art. 11 da LC nº 214/2025.
Esse grupo organiza os dados declarados pelo prestador, necessários para apuração dos tributos no ambiente da Sefin Nacional.
Inclusão de campos específicos na NFS-e
Na NFS-e gerada após validação, são incluídos campos calculados relacionados a:
- Alíquotas aplicáveis e base de cálculo.
- Valores de IBS e CBS destacados.
- Totalizadores por tributo e operações específicas (ex.: isenção, não incidência, substituição tributária).
Essas informações seguem segregadas entre “comuns ao IBS/CBS”, “somente IBS” e “somente CBS”.
Anexos técnicos
Foram disponibilizados dois novos anexos técnicos:
- Anexo VI: layout técnico atualizado com os novos campos, regras de negócio e estrutura XML.
- Anexo VII: tabela de códigos da operação (cIndOp), fundamental para identificar a natureza da operação e sua repercussão tributária.
Glossário técnico
A nota inclui um glossário técnico com explicações detalhadas sobre cada elemento do XML (ex.: tipo, ocorrência, tamanho, descrição, caminho no XML), o que contribui para maior segurança na implementação.
Considerações finais: planejamento e acompanhamento são essenciais
As alterações promovidas pela Nota Técnica nº 003/2025 evidenciam que a transição para o novo modelo de tributação sobre o consumo não será apenas normativa, mas profundamente operacional. A padronização da NFS-e, além de tecnicamente complexa, terá impactos diretos sobre a rotina das empresas, a infraestrutura dos municípios e a dinâmica de arrecadação dos novos tributos.
Nesse cenário, não basta cumprir prazos ou atender formalmente às exigências legais. Será necessário planejamento estruturado, envolvimento de múltiplas áreas internas (tributária, contábil, TI) e monitoramento constante das atualizações técnicas e normativas.
Os desafios são significativos, principalmente para municípios com limitações tecnológicas e para empresas com operações em múltiplas jurisdições. Porém, quanto mais cedo se iniciar a adequação, menor será o risco de inconsistências, retrabalho ou interrupção na emissão de documentos fiscais.
A reforma tributária está em andamento, e a NFS-e será um dos primeiros marcos operacionais de sua implementação. O sucesso nessa fase dependerá menos de respostas prontas e mais da capacidade de adaptação, leitura técnica e reação oportuna frente às mudanças que seguirão ocorrendo nos próximos meses.
Em um ambiente de transformação, quem se antecipa, se estrutura e acompanha com atenção sai na frente.
Art. 62, LC 214/2025
Art. 62.Ficam a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios obrigados a:
I – adaptar os sistemas autorizadores e aplicativos de emissão simplificada de documentos fiscais eletrônicos vigentes para utilização de leiaute padronizado, que permita aos contribuintes informar os dados relativos ao IBS e à CBS, necessários à apuração desses tributos; e
II – compartilhar os documentos fiscais eletrônicos, após a recepção, validação e autorização, com o ambiente nacional de uso comum do Comitê Gestor do IBS e das administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
§ 1º Para fins do disposto no caputdeste artigo, os Municípios e o Distrito Federal ficam obrigados, a partir de 1º de janeiro de 2026, a:
I – autorizar seus contribuintes a emitir a Nota Fiscal de Serviços Eletrônica de padrão nacional (NFS-e) no ambiente nacional ou, na hipótese de possuir emissor próprio, compartilhar os documentos fiscais eletrônicos gerados, conforme leiaute padronizado, para o ambiente de dados nacional da NFS-e; e
II – compartilhar o conteúdo de outras modalidades de declaração eletrônica, conforme leiaute padronizado definido no regulamento, para o ambiente de dados nacional da NFS-e.
§ 2º O disposto no § 1º deste artigo aplica-se até 31 de dezembro de 2032.
§ 3º Os dados do ambiente centralizador nacional da NFS-e deverão ser imediatamente compartilhados em ambiente nacional nos termos do inciso II do § 1º deste artigo.
§ 4º O padrão e o leiaute a que se referem os incisos I e II do § 1º deste artigo são aqueles definidos em convênio firmado entre a administração tributária da União, do Distrito Federal e dos Municípios que tiver instituído a NFS-e, desenvolvidos e geridos pelo Comitê Gestor da Nota Fiscal de Serviços Eletrônica de padrão nacional (CGNFS-e).
§ 5º O ambiente de dados nacional da NFS-e é o repositório que assegura a integridade e a disponibilidade das informações constantes dos documentos fiscais compartilhados.
§ 6º O Comitê Gestor do IBS e a RFB poderão definir soluções alternativas à plataforma NFS-e, respeitada a adoção do leiaute do padrão nacional da NFS-e para fins de compartilhamento em ambiente nacional.
§ 7º O não atendimento ao disposto no caput deste artigo implicará a suspensão temporária das transferências voluntárias.