“Estamos diante de uma das maiores transformações do sistema tributário brasileiro. Mas será que a proposta foi suficientemente madura para o tamanho do desafio?”
Nos últimos meses, muito se discutiu sobre os avanços da Emenda Constitucional n.º 132/2023, que institui a dualidade do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). O discurso oficial reforça os benefícios da simplificação, neutralidade e justiça fiscal. Mas uma análise mais atenta, feita pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), revela um cenário preocupante: o número de processos judiciais pode triplicar.
O alerta do Judiciário: litígios à vista
O relatório do grupo de trabalho do STJ, instituído pela Portaria STJ/GP nº 458/2024, foi claro: o novo modelo pode gerar até três cobranças para o mesmo fato gerador — uma por cada ente federativo (União, Estado e Município). Isso, por si só, representa um retrocesso no que deveria ser uma reforma pautada na unificação.
“Se antes tínhamos múltiplos tributos sobre o consumo, agora temos múltiplos credores para um mesmo fato. Simplificamos a forma, mas mantivemos a complexidade prática”.
Além disso, o STJ criticou duramente a proposta da AGU e do Ministério da Fazenda de concentrar o contencioso em um único órgão e criar ações originárias no STJ, o que seria, segundo os ministros, administrativa e orçamentariamente inviável, além de comprometer o contraditório e a ampla defesa.
A multiplicação das ações: o risco de sobrecarga sistêmica
Cada crédito tributário gerado pode demandar execuções fiscais separadas, o que compromete ainda mais a eficiência do sistema judiciário. E não para por aí: as ações de defesa do contribuinte contra cobranças indevidas também terão que ser ajuizadas contra cada um dos entes federativos.
Imagine um contribuinte que conteste um lançamento indevido: ele pode ter que litigar simultaneamente com a União, o Estado e o Município. O cenário é de fragmentação extrema, que ameaça não só a economia processual como também a coerência jurisprudencial.
Quais as soluções propostas pelo STJ?
Mesmo diante das críticas, o STJ sugeriu alguns caminhos para mitigar os riscos:
- Unificação da cobrança de IBS e CBS;
- Fixação de limite de alçada para execuções fiscais, evitando ações para valores irrisórios;
- Exigência de prévio requerimento administrativo, antes do ajuizamento das ações.
O que isso representa para empresas e operadores do Direito?
Se confirmadas as previsões do STJ, a Reforma pode gerar um efeito colateral indesejado: a judicialização em massa.
Empresários, advogados, magistrados e procuradores precisam estar atentos aos desafios que o novo modelo pode trazer. Apesar da promessa de simplificação, o cenário ainda é de transição e exige cautela. A expectativa é de avanços, mas, até que a estrutura esteja plenamente consolidada, a complexidade e a fragmentação podem se manter presentes — ou até se intensificar temporariamente.
Conclusão: O Judiciário não é contra a Reforma. Mas faz um alerta que não pode ser ignorado: é preciso ir além da arquitetura legal e pensar na engenharia prática do novo sistema tributário.
A pergunta que fica é: vamos corrigir a rota enquanto ainda é tempo, ou caminhar para uma judicialização crônica do novo modelo?